Solstício de Inverno – novo ciclo

Todos os solstícios e equinócios nos reunimos em coletividade aqui em Junana para celebrar em rezo os ciclos da vida. Assim acontece, de três em três meses, o Rezo do Bem Viver, nesse extremo sul do que denominam Mata Atlântica, também conhecida por alguns Mbya Guarani como Nhe’ery, onde o Espírito se banha.

Celebrar os ciclos faz parte de um profundo trabalho de reconexão com a dança cósmica do universo desde esse planetinha – e, mais especificamente, desde esse ponto que habitamos, de estações tão marcadas. Uma ação para despertar a sensibilidade de maneira que possamos sentir cada umas das estações em nosso corpo, ao nosso redor, nas árvores e pássaros, em cada nascer e por do sol, na inclinação da lua, na temperatura da água, na intensidade dos ventos, no nosso cotidiano. Descolonizar nosso caminhar é sair do modo automático de produção e consumo para pisar consciente de ser parte de ciclos muito maiores. E celebrar.

Agora estamos deixando o outono, quando as noites vão ficando cada vez mais longas. As colheitas foram feitas, e é necessário avaliá-las. Tempo de frio e recolhimento. De selecionar as sementes que vão ser plantadas no próximo ciclo. E, no solstício de inverno, um novo ciclo solar inicia. Depois de termos atingido o auge de distanciamento em relação ao sol, mais uma vez voltamos a nos aproximar da luz e do calor. Apesar do frio que ainda impera, há renovação. Os dias, pouco a pouco, vão ficando mais longos e mais quentes. É momento de preparar a terra para o plantio na primavera.

No outono trabalhamos o elemento ar, a mente. Entender, avaliar. Nos desvencilhar de suas armadilhas para poder visualizar. No inverno, o elemento terra, o corpo. Cuidar, materializar. Rachar a lenha que permite acender o fogo. Que honremos nosso corpo, nosso templo, nosso veículo nessa ora divertida ora desafiadora jornada planetária. Que possamos nos nutrir e nutrir a terra em todos os sentidos. Nutrir a humanidade, tão carente, de possibilidades de boa vida. E honrar as forças da criação.

Que possamos vivenciar plenamente essa transição, nos despedir do ciclo que passou, deixar pra trás o que não serve mais, cuidar bem do que escolhemos manter e multiplicar, e agradecer por ser parte desse grande movimento da vida.

Saudamos todas as ancestralidades, os povos indígenas que reexistem com suas sabedorias e modos de vida, e nos permitem acessar sementes e conhecimentos fundamentais para a convivência em harmonia no planeta. Saudamos quem veio antes de nós e quem ainda está por vir. Reverenciamos o poder das sagradas medicinas, que nos permitem acessar sem mediações esses profundos saberes, cada quem a seu tempo e a seu modo.

Nos juntar em círculo, em coletividade, ao redor do fogo para celebrar os ciclos, é desses pequenos atos ancestralmente revolucionários que enchem a vida de sentido.

Ha’eweiii!

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